O Molécula do Mês é uma inicitiva do banco de estruturas de proteínas RCSB PDB (A Resource for Studying Biological Macromolecules – Protein Data Bank). Mensalmente, David Goodsell escolhe uma estrutura interessante e a descreve, além de ilustrar muito bem. As ilustrações são disponibilizadas em uma imagem de alta resolução que pode ser baixada.
Goodsell não só sabe dar apelo estético às imagens, como as torna informativas e fáceis de entender. Acompanhe estas duas proteínas do vírus Influenza para ver o que a estrutura pode nos informar:

hemaglutinina

Hemaglutinina

Hemaglutinina

ResearchBlogging.orgA hemaglutinina (HA) é uma proteína que se situa na camada mais externa do vírus, o envelope. Ela reconhece um açúcar da nossa membrana celular, o ácido siálico, e é a responsável pelo reconhecimento e ligação do vírus a nossas células do sistema respiratório.

Seu nome vem desta capacidade de reconhecer e se ligar à células e aglutinar hemácias (os glóbulos vermelhos do sangue), um dos primeiros testes desenvolvidos para diagnosticar o vírus. Sua numeração é dada com base na variação dos aminoácidos e são conhecidos mais de 15 tipos de HA, sendo H1, H2 e H3 as mais comuns em vírus que infectam humanos.

HA_2

Hemaglutinina em ação

Ela reconhece nosso ácido siálico pela porção verde mostrada na figura acima, e se liga a ele. Com isso, o vírus é endocitado pela célula, ou seja, envolvido pela membrana e levado dentro de uma vesícula. A célula tenta digerir o conteúdo da vesícula diminuindo o pH dentro da vesícula, mas isso induz uma mudança no formato da hemaglutinina, expondo a região em vermelho que possui muita afinidade pela membrana da vesícula, com isso, a hemaglutinina se torce e aproxima a membrana do envelope do vírus, fundindo ambas e liberando o vírus da vesícula.

Neuraminidase ligada ao inibidor

Neuraminidase ligada ao inibidor

Neuraminidase

A neuraminidase (NA) reconhece a mesma molécula que a hemaglutinina, o ácido siálico da membrana celular. Mas realiza sua função de maneira oposta, seu papel é ajudar o vírus a deixar a célula invadida.

A neuraminidase é necessária para remover o ácido da célula e permitir que o vírus recém sintetizado consiga brotar para invadir a próxima célula. Por isso, ela também se localiza no envelope do vírus, e é a segunda proteína mais comum, depois da hemaglutinina. Também é classificada de acordo com sua variedade, e são conhecidas 9, sendo que N1 e N2 são as mais frequentes em humanos.

Neuramindase ligada a anticorpos

Neuramindase ligada a anticorpos

Sua capacidade de reconhecer e cortar o ácido siálico é comprometida por inibidores, que utlizamos como drogas antivirais, como a molécula em azul claro, atacando a NA do vírus H5N1. Por estar na superfície do vírus, é um dos alvos mais comuns de anticorpos, mostrados em azul na figura acima. Sua variação causada por mutações no material genético do influenza é o que permite que variantes novas deixem de ser reconhecidas pelo sistema imune.

O reconhecimento dos açucares de membrana dos diferentes tipos de hospedeiros, o papel na entrada e saída da célula infectada, o ataque do sistema imune e de antivirais são algumas das características que dão a importância da hemaglutinina e da neuraminidase, que são essenciais para entender a gripe e serão visitantes frequentes deste blog.

Wiley, D., & Skehel, J. (1987). The Structure and Function of the Hemagglutinin Membrane Glycoprotein of Influenza Virus Annual Review of Biochemistry, 56 (1), 365-394 DOI: 10.1146/annurev.bi.56.070187.002053

Skehel, J., & Wiley, D. (2000). RECEPTOR BINDING AND MEMBRANE FUSION IN VIRUS ENTRY: The Influenza Hemagglutinin Annual Review of Biochemistry, 69 (1), 531-569 DOI: 10.1146/annurev.biochem.69.1.531

Colman, P., Varghese, J., & Laver, W. (1983). Structure of the catalytic and antigenic sites in influenza virus neuraminidase Nature, 303 (5912), 41-44 DOI: 10.1038/303041a0